DO SÃO BENTO AO CARAÇA : ONDE ESTÁS, SENHOR MEU DEUS?
J.UM
Tarja-se de luto esta coluna, porque nosso coração está chorando. Como é possível que, em meio a tanta maldade, hajas subvertido o que é bom? Quando o dia surgir dos píncaros daqueles alcantis, que espetáculo de Jerusalém desolada não lhe será a fortaleza de sabedoria e santidade! Quando se incendiar o cabeço de névoa da Carapuça, não mais acenderá uma alvorada no topo de tua igreja, mas iluminará os pátios desertos do colégio gigante, onde se ouvia a gargalhada alegre e o chilreio de pássaros da juventude de Minas.
E foi lá que tanto suor correu nas frontes e foi para isso que, século e meio, povoaste de alegria e de trabalho aqueles salões e corredores? Não ouviste as éclogas e a Eneida de Vírgílio, os versos suaves de Ovídio, o tonitroar das orações de Túlio, as narrações de César e a História de Tácito, como só no Caraça as podia ouvir? Não viste a tua igreja gótica, donde para ti ascendia o encanto de tanta música, onde tão majestosas se cumpriam as cerimônias do teu culto? Não viste o templo onde para ti se evolava o perfume de tanta oração fervente, tua casa onde tanta lágrima correu de nosso coração por faltas tão leves comparadas às de hoje? Quando, nos retiros espirituais, se reproduzia o ascetismo e o escrúpulo da Tebaida? Quando da boca de teus pregadores se despenhavam sobre nossas cabeças inocentes tuas ameaças, no estilo espartano de então que já hoje mal se compreende?
Não viste os padres de São Vicente cheios de ciência e de humildade seguindo os ensinamentos de seu fundador? Não viste os Lazaristas sozinhos beneficiarem com o ensino gratuito a tantos milhares de teus brasileiros? Não os viste na formação de um clero, num trabalho quase gratuito, nos seminários de teus zelosos pastores?
Se tu és brasileiro, e tu o és, bem sabes que um caracense mudou a capital de Minas e fundou Belo Horizonte, que é hoje um sonho de beleza debruçado a teus pés. Saberás que o teu ungido fundou Brasília, como uma Jerusalém em festa, dentro dos sertões de Goiás, ele, que, sem o Caraça, sem a casa-mãe dos Lazaristas, jamais teria aproveitado os carismas de que o envolveste.
marca do trágico incêndio de 1968 |
de tanta santidade e de tanto saber. Não! Não pode evanescer o sal, nem pode extinguir-se a luz da tua atalaia. Agora, mais do que nunca, urge a pregação de tua verdade e do teu amor, urge a luz intelectual verdadeira, para que o Brasil não deserte de tua falange santa.
Naqueles tempos, quando o grande Távora fundou o Santuário de tua Mãe, era o povo ignorante, mas era bom e crente. Hoje, já há quem fale em dispensar-te a existência nesta corrida louca da ciência que, se a alguns conduz para ti, a outros deslumbra e materializa. Não deixarás que, à míngua de teu colégio, se erga em cada coração caracense u’a muralha perene de lamentações. Não permitirás que descreiamos do teu poder. Mostra aos infiéis, não a nós, que, ainda nas trevas com que nos ofuscaste os sentimentos, em ti cremos e te adoramos, chorando.
Não ficará sozinha, dentro da madrepérola branca nascida dos veios castos daquele granito, que é o Santuário da Senhora Mãe dos Homens, não ficará sozinha a Mãe que nos abençoava cada noite e nos sorria a cada alvorecer. Porque, em cada coração caracense, tem ela um santuário e um altar. E porque hás de ressurgir o teu colégio, o colégio nosso, nosso orgulho e nossa saudade. E quando fecharmos os olhos aos dias da terra, iremos tranqüilos, por sabermos que o sol da manhã seguinte, ao se debruçar do alto daqueles alcantis, sorrirá para o teu colégio, fênix renascida da negrura das cinzas, jóia de beleza e símbolo da alma cristã de Minas.
Aos infiés, Senhor, aos infiéis.
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