DO SÃO BENTO AO CARAÇA: "VOU COMER CARÁ"
J.UM
Para onde é que você vai, menino?
Vou para o Caraça comer cará. Brincadeira trocadilhesca de menino da roça, que pensa estar fazendo muita vantagem. Vai ser bobo, trem!
Era a imagem do Caraça, velho educandário, severo, com uma tarimba, àquele tempo, de quase cem anos, de serviços a Minas e ao Brasil. Caraça de Afonso Pena, do ministro João Ribeiro, Artur Bernardes, Raul Soares, Melo Viana, Olegário Maciel e de tantos outros que deixaram ao Brasil ricas lições de honradez. Vamos devagar.
Você vai para o Caraça? Então se prepare para enfrentar seis anos de preparatórios, com raros “suetos” (feriados), férias passadas no próprio colégio.
Concluído o terceiro ano, o ano peneira (desculpe, Peneira, foi sem querer!), você, se não tomar bomba, poderá ir passar em casa três semanas, três semanas só, após uma viagenzinha de cinco dias a cavalo, viajando na média, oito léguas diárias.
Você vai para o Caraça? Então não será já o galinho do São Bento, sempre respeitado e adorado pelos companheiros, os seus malungos da roça, que você, aliás, sempre adorou.
Você vai para o Caraça? Então adeus primeiro lugar na Escola, porque você vai topar com os nortistas educados pelos “fetedês”, inteligentes pra peste. Você não fará ruim figura, é certo, mas, primeiríssimo, nada! Além disso, lá vão com você dois meninos cobras – o Zé Júlio e Zé Lourenço – sempre à sua frente alguns passos. Você será bom em todas as matérias, mas, do segundo ano para a frente, você vai ver, com o Padre Bernardo, que falta no seu cérebro, um quartinho estanque, uma gavetinha, a das santas matemáticas. Em matemática, todas as picadas que você abrir, se sujarão, de novo, e você terá de abri-las, cada vez que delas precisar. Você vai ver Zezé do Juca Campos: com notas sempre boas, você terá, cada fim do primeiro e segundo semestres, quatro em matemática, sempre quatro, constante e matematicamente quatro. E foi para isso que homem nasceu, meu Deus! Para tirar quatro em matemática! Que complexo para a vida! Com que temor reverencioso e sagrado você olhará os semi deuses que são os matemáticos, os quais, ao fitá-lo, parecem dizer-lhe: “odi profanum vulgus et arceo”!