quarta-feira, 23 de outubro de 2013

Escala - 10/11/1969 - “A Peneira” N°87 - J.UM



ESCALA 

J.UM

Tovaca













Mês de outubro.

A tovaca cantou.

O capim sempre-verde sorriu,

porque a chuva chegou.

E a gente ficou alegre:

a vida continua.



A tovaca deu

a escala cromática.

Perfeita e engrenada.

Contas de seda e nácar

caindo na bacia do tempo.



Melodia

una e fechada

hermeticamente,

sem igual.



Na melancolia do abismo,

na lindeza fônica

da sedução da dúvida.

A tovaca cantou.



Transposição do caos,

das vibrações latentes,

para o cosmos

sonoro e claro.



O ribeirão de notas desceu,

em ondas de veludo e nácar,

a escala em caracol do som.

Veio

desafiando a morte

numa explosão de vida.



Veio

de todos os planos do invisível,

das profundezas dos passados,

do fundo das idades

do mundo de sombras

para além do humano.

No instantâneo irrefreável do instinto

suave e triste

como Sul-América.



Veio, como o “Não” primitivo

que antecedeu  ao “Sim” da criação.


Com o rictus final do cepticismo

em gargalhada de megera,

em oposição polar

à beleza feminina

da melodia aveludada

pingando, em contas de seda e nácar,

na bacia do tempo.



Canto da tovaca.

Mulher formosa.

Sereia incomparável

terminando em cauda de peixe feio.

Afirmação.

Com o travor da dúvida e do humor.

Viva Chile... mierda!








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