J.UM
Adeus, meu sonho!
Não sei para onde vou,
ou se ainda nos veremos.
ou se ainda nos veremos.
Que nos espera?
Ver-nos-emos jamais,
meu irmão sonho?
Éramos, dois malungos,
ou dois colegiais,
que andavam sempre juntos
e se entendiam bem,
para quem
a vida era bonita
e o céu de renda e chita
tinha uma graça infinita.
Você trazia na boca
um sorriso brejeiro
que fazia
estralar de riso
por qualquer tolice,
seu companheiro.
Lembra-se?
Íamos, pela manhã,
olhar os passarinhos.
Sabíamos de cor
as músicas dos ares.
Às vezes, íamos escutar
lá no fundo da grota,
uma fonte conversadeira,
ou prosar com o cavalo de engenho,
em frente à cachoeira.
Lembra-se daquele galo seresteiro,
que varava o dia cantando
e cantava a noite inteira?
Parecia ter nascido
antes da música.
Ficávamos, alta madrugada,
escutando bater
a porteira da estrada,
pondo sentido
nos desafios dos galos
orquestrando a melodia de açúcar
do luar claro.
Mais tarde, o coração batia forte,
no efêmero triunfo ilusório,
ou no fracasso
estável como pobre teimoso
à porta do pão duro.
Punhamo-nos também,
dentro da noite escura,
a recitar poesias
de José Albano e Fagundes Varela,
Padre Antônio Tomás
e Henriqueta Lisboa.
Ou “a pedra no caminho”
Do poeta de cara amarrada
como o Cauê.
Ou: “Não! não quero nos meus braços
a memória de teu corpo”
- do ministro Francisco Campos -
E quanta coisa mais?
Nem sei o quê.
Gostávamos de ir ver o pôr do sol,
Você e eu sozinhos.
Eu e você.
Era lindo o pôr do sol.
Vermelho, roxo, cinza.
cobalto, esmeralda e topázio.
O São Bento era um recorte verde,
no cinto da tarde loura,
verde e brilhante, lembrando
um espelho bisauté
no proscênio da noite.
Depois,
quando a terra se mirava
no espelho da lua cheia,
voltávamos nós dois
tropeçando e olhando
o rosário da cidade tranquila.
Agora, a festa se acabou.
Desçamos a montanha da vida,
Mas, antes da descida,
quero olhar, uma vez mais,
as voltas dos caminhos bonitos
que ficaram para trás.
Ai!...
-Faça de conta que não ouviu.
Foi o estalar da corda
do coração cansado...
Coitado do meu coração!
Trabalhou tanto para mim!
Judiei tanto dele!
Obrigado por tudo, coração!
Quando eu morrer,
quero uma flor no peito.
Flor é a mulher de sempre,
Você, meu sonho, é a flor.
Quero morrer, com você
no canto do meu leito.
Ou no leito de uma estrada.
Morrer com você ao meu lado,
Vendo a bênção de Deus
nas safiras dos céus.
Ah! eu me sinto tão cansado!
Adeus!
Adeus, meu companheiro!
Agora, meu sonho,
meu irmão siamês,
vamos ver a realidade
do ser ou não ser.
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