quarta-feira, 23 de outubro de 2013

Cigarra de Rodas - 25/08/1969 - “A Peneira” Nº 82 - J.UM



CIGARRA DE RODAS 

J.UM

























 
Silêncio de dormideira

à uma hora da tarde

no sol da serra do São Bento.

Carro de bois carregado de lenha preta

sobe a serra cantando.



Canto de carro na estrada

na alameda do canto das cigarras

que cantam serra acima

do lado de cima,

e ribeirão abaixo

do lado de baixo.



Uma lágrima comprida

nos olhos de araçá maduro do Tenente

chorando os tempos de garrote

e as novilhas dengosas daquele tempo.



E o carro canta.

O carreiro Zé Coelho é vigilante

“afasta Fidalgo, vem cá Bordado!”

E o Brilhante, boi de coice,

junto do Tenente;

O Brilhante que veio dos Caetanos

vai lembrando meninices da Pitanga

e Santa Rita dos Impossíveis.



Serra do São Bento, pesada,

carro duro de lenha,

azeite e carvão no eixo,

para cantar entoado.



A alegria do carreiro

é ver o carro cantar;

a alegria das morenas

é ver a fita voar.



Carro chiando pela rua do Buraco,

- olha o Zé Roque que inventou

  o microfone de garrafa -

Capitão Ludgero, de fraque velho à porta,

Sá Altina, Maria Eulália e Pedro Paca.

Zé Catalão e o Lé,

Oliveira de Oliveira Mendes.



“Abre, Raminho, carrega Maiado!”

Rua do Topa - Tudo.

O Zé da Cunha fazendo selim bonito,

Vicente Roberto, sentado no balcão,

tirando bicho no pé

com a faca de cortar queijo

para vender aos outros.



Olha o Luiz da Ritinha,

comprando duzentos réis de queijo lá

para sua irmã mais velha

-"Donde é esse queijo Luiz?

- É lá do Vicente Roberto.

- Pode ficar com ele, porco."

E o esgabilado... lépo.

A lenha preta é lá para a Dona Augusta,

presente de aniversário

vindo do Juca Campos.



O carro canta no largo,

Joãozinho Coelho, homem rico e bom,

sentado à porta

no tamborete,

de chapéu na cabeça,

barba comprida tremendo no vento.

Mineiro de cepa antiga,

tudo pra ele é ”coisa”.



“Subir o morro”.

Olha o Paquetá e a Várzea lá em baixo

- "ôa!..."

O carro calou.

A cigarra de duas rodas

parou de cantar.



-Dona Augusta Campos do Amaral

Antônio Campos Baguari

a lenha taí.



















 




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