CIGARRA DE RODAS
J.UM
Silêncio de dormideira
à uma hora da tarde
no sol da serra do São Bento.
Carro de bois carregado de lenha preta
sobe a serra cantando.
Canto de carro na estrada
na alameda do canto das cigarras
que cantam serra acima
do lado de cima,
e ribeirão abaixo
do lado de baixo.
Uma lágrima comprida
nos olhos de araçá maduro do Tenente
chorando os tempos de garrote
e as novilhas dengosas daquele tempo.
E o carro canta.
O carreiro Zé Coelho é vigilante
“afasta Fidalgo, vem cá Bordado!”
E o Brilhante, boi de coice,
junto do Tenente;
O Brilhante que veio dos Caetanos
vai lembrando meninices da Pitanga
e Santa Rita dos Impossíveis.
Serra do São Bento, pesada,
carro duro de lenha,
azeite e carvão no eixo,
para cantar entoado.
A alegria do carreiro
é ver o carro cantar;
a alegria das morenas
é ver a fita voar.
Carro chiando pela rua do Buraco,
- olha o Zé Roque que inventou
o microfone de garrafa -
Capitão Ludgero, de fraque velho à porta,
Sá Altina, Maria Eulália e Pedro Paca.
Zé Catalão e o Lé,
Oliveira de Oliveira Mendes.
“Abre, Raminho, carrega Maiado!”
Rua do Topa - Tudo.
O Zé da Cunha fazendo selim bonito,
Vicente Roberto, sentado no balcão,
tirando bicho no pé
com a faca de cortar queijo
para vender aos outros.
Olha o Luiz da Ritinha,
comprando duzentos réis de queijo lá
para sua irmã mais velha
-"Donde é esse queijo Luiz?
- É lá do Vicente Roberto.
- Pode ficar com ele, porco."
E o esgabilado... lépo.
A lenha preta é lá para a Dona Augusta,
presente de aniversário
vindo do Juca Campos.
O carro canta no largo,
Joãozinho Coelho, homem rico e bom,
sentado à porta
no tamborete,
de chapéu na cabeça,
barba comprida tremendo no vento.
Mineiro de cepa antiga,
tudo pra ele é ”coisa”.
“Subir o morro”.
Olha o Paquetá e a Várzea lá em baixo
- "ôa!..."
O carro calou.
A cigarra de duas rodas
parou de cantar.
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