sábado, 23 de novembro de 2013

Apresentação do Blog “Do São Bento ao Caraça” - 12/11/2013


DO SÃO BENTO AO CARAÇA

APRESENTAÇÃO


Seja muito bem-vindo/a!
Faça a interessante jornada proposta pelo Blog "DO SÃO BENTO AO CARAÇA". 
José Rabello Campos, J.UM, e amigos que escreveram sobre ele o/a conduzirão a uma viagem onde serão descerradas as cortinas da sensibilidade do autor, suas experiências, impressões, sentimentos, valores e conhecimentos de magnífica amplitude. Tudo apresentado de forma leve, agradável e entremeada de casos curiosos sobre ele mesmo, seus amigos, professores caracences e personagens de sua terra, Virginópolis.

Espero que você aprecie este trabalho, que reune textos de grande valor literário e histórico, importante reserva da memória virginopolitana, mineira  e caracence. Verdadeiro patrimônio imaterial.

Que o nome de José Rabello Campos, J. UM, seja conhecido, preservado, divulgado e respeitado pelo que representa de valor humano, cristão, de padrão ético, competência profissional, amorosidade e exemplo de disciplina no estudo diário e de aprimoramento pessoal.

Este Blog é, também, uma declaração de amor, de respeito e de agradecimento ao nosso pai que, usando a sua inteligência ímpar, soube escolher para sua mulher, Maria José de Aguiar Coelho, a companheira e mãe das mais amorosas e dedicadas que já existiu.

Por favor, se possível, deixe o seu comentário; para isso é necessário que você tenha ou crie uma conta no Google. 

Celina Consuelo Rabello Campos


Para acessar todo o conteúdo do Blog, use a coluna índice, da direita, clique sobre o ano, depois sobre o mês e, por fim, sobre o texto do seu interesse. Ou clique diretamente sobre o texto, se ele estiver à mostra.
Para facilitar-lhe conhecer, de uma só vez, tudo o que foi postado, o que a coluna índice da direita não faz, apresento-lhe, abaixo, como o Blog foi constituído:

   2013


 Novembro
- 06 textos que apresentam o autor
- 02 poemas   
Outubro
- Hino ao Aniversário de Virginópolis
- 39 poemas
- 02 discursos para um orador e uma paraninfa de turma escolar
Setembro
- 12 coroações de Nossa Senhora (letra e música – algumas pautas não foram encontradas)


         2011             


           
Novembro
- 03 coroações de Nossa Senhora
Maio
- 01 poema para recepção do primeiro livro escolar
- 01 discurso para o Dia dos Pais
Março
- 18 crônicas sobre a ida para o Caraça, experiências no colégio/seminário, casos e impressões sobre personagens caracences.


- 36 textos que abordam personagens de Virginópolis, vivências pessoais, percepções sociais, impressões, comentários e discursos como paraninfo de turma do Ginásio e Escola Normal.



Agradecimentos - 12/11/2013


AGRADECIMENTOS


                                               
Dr. Amilar

Agradecimento especial, "in memorian", ao Dr. Amilar da Cunha Menezes, criador do jornal “A Peneira” e seu dedicado Editor. Sem essa valiosíssima fonte, não nos seria possível coligir esta preciosa coletânea, pequena amostra que ficou de toda a produção literária de José Rabello Campos. Ao Dr. Amilar, amigo pessoal de nosso pai e que sempre deu a ele o merecido valor, nosso muitíssimo obrigada. Atendeu também  ao nosso pedido de que prefaciasse o livro que devemos, futuramente, publicar, com a maior disposição e demonstração de afetividade. Ainda é preciso registrar nosso reconhecimento e gratidão ao Dr. Amilar, porque dele partiu a ideia e foi um dos maiores batalhadores  para que o Fórum da comarca de Virginópolis fosse nomeado como Fórum Dr. José Rabello Campos.

À Maria Helena Campos Coelho, “in memorian”, nosso particular agradecimento, por ter nos oferecido, com total desprendimento, uma coleção de “A Peneira”, bem mais completa do que a de que dispúnhamos.

Ao meu irmão, Eduardo Parmênio Rabello Campos e à sua mulher, Iônia Barbalho Meira Campos, nossa gratidão pelo esforço que fizeram na busca e em enviar-nos, até por Fax, vários  números de "A Peneira" da coleção de Dª Edith Coelho do Amaral; e por manterem o ideal de transformar este Blog em um livro.

À Maria do Rosário Vasconcelos Rabello Campos, nosso reconhecimento e gratidão por ter iniciado o trabalho de digitação destes textos, numa época extremamente difícil de sua vida, mostrando-nos sua amorosidade e dedicação, cooperando de forma ativa com a primeira ideia de lançamento de um livro com a produção literária de J.UM.

À Solange Luís Aguiar, querida amiga, que se ofereceu, com a maior disponibilidade, para digitar parte destes textos, nosso muito obrigada.

À Annette Maria Campos Leite, minha irmã e exímia Professora de Português, por seu trabalho primoroso e paciência na revisão dos erros de digitação, nosso obrigada e o compartilhamento desta alegria.

Ao meu filho, Marcus Vinícius Campos Bandeira, nosso agradecimento por ter, amorosamente, criado este Blog e por seu auxílio na digitação dos textos,  acompanhando com entusiasmo,  o crescer deste trabalho.

Ao meu irmão, José Lupciano Rabello Campos, nossa gratidão pela biografia escrita com o amor e a admiração que nutria por nosso pai, a quem seguiu os passos na carreira. Tenho certeza de que está se alegrando com esta publicação.


Agradecemos também ao Dr. Amilar da Cunha Menezes, “in memorian”, ao Dr. Antônio Pinheiro Costa, Padre Absalão Martinho Coelho, “in memorian” e Bernadete Campos Coelho Pinto pelos textos publicados em “A Peneira”, em que fazem aberto depoimento sobre a pessoa de José Rabello Campos.

Celina Consuelo Rabello Campos






Prefácio - Outubro de 2004 - Dr. Amilar da Cunha Menezes


PREFÁCIO


Amilar da Cunha Menezes



Dr. Amilar da Cunha Menezes
















                      Cultura exponencial deste quadrante das Minas Gerais. Impossível retratar Dr. Rabello, prefaciando singela homenagem, ora lhe prestada. Não se trata, pois, aqui, de prefácio a esparsas publicações, coligidas aqui e ali. Feliz lembrança inserida na programação do Festival da Jabuticaba de 2004, ao ensejo do centenário de seu nascimento. Na carência de um museu de imagem e de som, demandaria, este tributo de admiração inenarrável, de muito tempo e preparo para o registro da saga deste compêndio de cultura.
Os anais de nossa história pátria, sempre pecaminosos, lamentavelmente têm sido feitos de boca a boca, de pai para filho. E os que privaram de tão gratificante convívio se vão rareando. E as novas gerações ficam no imaginário. Quase sempre, narrativas desprovidas de conteúdo suculento que traduzam a grandeza de um personagem da magnitude deste luminar, patrimônio nosso.
Assim, desnecessárias se tornam análises em torno do que conseguiram reproduzir da lavra “rabelineana”. Aqui, tão apenas modesto enfoque da maior representatividade de uma cultura humanista e universal. Pinceladas sobre o prodigioso talento do São Bento. O seu despontar iluminado nas colinas do Caraça – verdadeiro Olimpo, berço greco-latino de seu cabedal humanista. De sabença geral as incontáveis personalidades, da maior projeção no cenário nacional, e que por lá passaram, antes, durante e empós. Ao depois, o professor -  primus inter pares -. Campo de ação e valoroso tirocínio do magistério pela Capital mineira. E, na esteira do saber, de lá trouxe seus diplomas de bacharel, mestre, incluindo patente militar de Coronel.
E Virginópolis recebe o Doutor “de omni re scibili “. Porta-voz de sua e nossa terra, em qualquer recepção de gala. O intérprete para o visitante, fosse grego, alemão, francês ou de fala shakespereana. Advogado por profissão, tribuno por vocação. Cicerone seguro na emancipação política de Virginópolis, na condução dos conterrâneos pelas seguras trilhas parlamentares da edilidade. Pelas tribunas forenses, o imbatível defensor. Pelas tertúlias e congraçamentos e solenidades oficiais, o orador incomparável. Na crônica jornalística (apud “A Peneira”), a expressão castiça da palavra fácil. Poeta de entrelaçar inspiração e reprodução. Leveza no flauteado da composição lírica. Estuante na trompa da epopéia a ecoar pelo universo (“Balada do Canário do Reino”). Regente em corais, arranjador de polifonia sacra. Um hobby em sua dimensão polivalente.
Dr. Rabello foi erigido por Deus, para Virginópolis. Trazendo à baila as palavras do vate da arte poética, reproduzidas pelo homenageado, em discurso por ele proferido há 35 anos: “Para nós, tem ele um nome mais eterno que o bronze. Mais sobranceiro que as pirâmides faraônicas, que não poderá derruir a chuva desgastante. Ou o Aquilão desenfreado ou a inumerável série dos séculos e a fuga dos milênios”.
Quando da sua mudança de residência, da terra para os páramos celestiais, “A Peneira”, periódico nosso que era dele, registrou, no enlutado abril de 1972: “Virginópolis em eclipse. Seu grande sol se escondeu atrás da cordilheira da morte. O maior luminar desta terra, o gênio desta região, a enciclopédia, poliglota, tribuno, jornalista. O orgulho patrocinense. Nosso intelectual, nossa cultura, nossa tradição e representação maior. Só Deus sabe quantas gerações se sucederão até que apareça outro vulto semelhante”.
O sábio que jamais deixou de ser estudante. Obstinado pelo saber. Até a hora em que fechou o livro da vida, e se apressou, e nos deixou para trás, indo para mais perto de Deus – de quem nunca se desgarrou – lá se completou. E continuou a representar a sua terra na Embaixada do esplendor, das luzes, das letras, artes, ciência, música... O arremate do bom e do belo. Do amor e do saber sem fim.


Nota: Dr. Amilar, brilhante Advogado e grande amigo, atendeu prontamente ao nosso pedido,  prefaciando o livro que pretendíamos  lançar, na comemoração do centenário de nosso pai, no Festival da Jabuticaba de 2004 e que foi adiado por termos descoberto, às vésperas da festividade, grande número de textos escritos por ele. 
 Celina Rabello  

  


Biografia - Texto de José Lupciano Rabello Campos



BIOGRAFIA





José Rabello Campos, Zezé para os familiares, Rabellinho para os amigos, nasceu em Virginópolis a 02 de novembro de 1904. Filho de José Ferreira Campos e Jovelina Campos Netta (Jovelina Rabello Netta - nome de solteira). São seus irmãos: Francisco Rabello Campos (Sr. Chiquinho Campos), Maria Efigênia Rabello Campos (Dª Nica) e Maria de Lourdes Rabello Campos (Dª Lourdes Campos Magalhães).

Fez as primeiras letras com D. Augusta Campos do Amaral sua tia-avó, que foi, posteriormente, a primeira professora pública do município.
Vinha a pé da Fazenda São Bento, local onde nasceu e que amou profundamente, tema de magníficas crônicas publicadas no jornalzinho “A Peneira”. Este trajeto diário para estudar, era de 12 quilômetros: 06 para vir à cidade e 06 para voltar. Aliás, este hábito das caminhadas, nunca o perdeu. Fazia-as em benefício da saúde, mas muito mais para apreciar a natureza e respirar o ar puro do campo.
Recebeu o diploma do antigo curso primário no Grupo Escolar Nossa Senhora do Patrocínio, hoje Escola Estadual Nossa Senhora do Patrocínio.
Aos 11 anos foi para o Caraça onde cursou os estudos preliminares e depois foi para Petrópolis, onde estudou Filosofia e Teologia.
Em 1927, depois de 12 anos de acurados estudos, foi residir em Belo Horizonte, onde lecionou no antigo Ginásio Mineiro, Colégio Arnaldo e Escola Regimental da Polícia Militar onde recebeu, por mérito, a patente de Coronel (ver registro na carteira da OAB, imagem abaixo).
Formou-se em Direito pela  Faculdade de Direito da Universidade de Minas Gerais, então conhecida por Escola de Minas (conforme registro na sua carteira de Advogado - OAB - e imagem no final do texto),  e a seguir, foi advogar em Guanhães e em sua terra natal.
Ali, teve vida ativa em todos os setores. Participou sempre das campanhas cívico-religiosas. Professor de História Universal e Línguas Estrangeiras no Ginásio local.
Na política, foi presidente de diretório, vereador em várias legislaturas e Presidente da Câmara.
Intelectual completo, grande bagagem cultural, foi poeta, cronista, orador de fama e mérito, matemático, músico, poliglota.
Estudou inglês sozinho, ficando em vigília até à madrugada para estudar e ouvir inglês na rádio BBC de Londres. Depois, no ICBEU, em Belo Horizonte, prestou exames e recebeu o célebre diploma de Michigan, dos Estados Unidos.
Indispensável em toda cerimônia cívica. Seus discursos, sábios e inflamados, arrebatavam a platéia. Sempre falou de cor e, muitas vezes, de improviso.
Na tribuna, onde suas defesas e o imbatível de sua lógica obrigavam ouvintes a remissões a Padre Vieira e Ruy Barbosa, apanágios de eloquência nos púlpitos da melhor retórica e oratória do Brasil.
Casou-se com a admirável Maria José de Aguiar Coelho, em 05 de junho de 1947 e tiveram os filhos: José Lupciano Rabello Campos, Annette Maria Rabello Campos (hoje, Campos Leite), Eduardo Parmênio Rabello Campos e Celina Consuelo Rabello Campos
Precocemente desaparecido, faleceu em 1º de abril de 1972, vítima de câncer.
Infelizmente, com tão rica produção literária em prosa e verso, não deixou livros publicados. Adotou como pseudônimo “J.UM”.

Texto de José Lupciano Rabello Campos, seu filho, também advogado e seu grande admirador.

   


  








Dr. Rabello - Nosso Advogado no Céu - 07/04/1972 - “A Peneira” Nº 139


Dr. Rabello – Nosso Advogado no Céu 


Amilar da Cunha Menezes



Dr. Rabello



Virginópolis em eclipse. Seu grande sol se escondeu atrás da cordilheira da morte. O maior luminar desta terra, o gênio desta região, a enciclopédia, o tribuno, o poeta, humanista, o orgulho patrocinense. Nosso intelectual, nossa cultura, nossa tradição: Dr. José Rabello Campos.
A Peneira, em especial, se viu no mais negro dos lutos. Foi-se seu cronista maior. Seu incentivador primeiro. Seu editorialista de pulso.
Nós perdemos o grande amigo. O irmão mais sábio. O pai extremoso. O amigo sincero.
Em luto, não temos condições psicológicas para meditar e externar a sua grandeza. Só Deus sabe o quanto de dor se abateu sobre nós e por sobre Virginópolis. Só Deus sabe quantas gerações se sucederão até que apareça outro vulto semelhante. Você, Dr. Rabello, foi demais. A falta que você está fazendo para a gente é de anestesiar a alma. A cidade talvez não saiba ainda aquilatar o quanto ficou mutilada. Perdeu a sua cabeça. Perdeu a sua sabedoria. Perdeu a sua voz.
Entre o gigante que você foi, mestre, ressalto aqui somente esta virtude impossível de ser praticada entre nós: - você não falava mal dos outros.
Quando Deus nos der tranquilidade e alguma resignação ante tamanha dor, algum esforço faremos para revelar a quem não te conhecia, o maravilhoso que foi.
O Ginásio e Colégio Normal ficaram de luto oficial e ofereceram bonita missa. Os grupos escolares também. Na Câmara Municipal houve sessão  de homenagem póstuma e seu salão de sessões passou a se chamar “Salão Dr. José Rabello Campos”. A prefeitura decretou feriado e luto oficial por três dias, constando do decreto tais considerandos:
- Considerando a irreparável perda sofrida por Virginópolis, com falecimento do DOUTOR JOSÉ RABELLO CAMPOS, ocorrido dia 1º de Abril do ano em curso.
Considerando tratar-se da figura exponencial que foi, em todos os setores de nossa vida comunitária, quer como simples cidadão, quer como representante, de fato e de direito, das nossas maiores causas, particulares ou públicas.
Considerando seus assinalados serviços, em prol de seu povo, desde o exemplar chefe de família que foi, às culminâncias da tribuna, da singeleza dignificante de sambentista autêntico até à mais alta legação política, ora na presidência da Câmara Municipal, ora à frente serena da representação republicana.
Considerando sua relevante missão de porta-voz de todos os nossos anseios, aqui na representação oficial de nossa gente, em solenidades festivas ou em cerimônias de luto, ali propugnando pela justiça, verdade, honradez e quaisquer outros valores; mais adiante na defesa dativa de muitos e, em outra parte, como enciclopédia viva de todas as nossas dúvidas, repositório de nossas melhores tradições;
Considerando sua missão dedicada e sacrificadamente zelosa, por anos a fio, no magistério, onde deu o melhor de si pela juventude estudantil;
Considerando o grande humanista, caracense de escol, apaixonado pelo estudo que fez dele lídimo clássico, helenista e latinista exímio, afeito às letras germânicas, e tendo o francês e inglês também como línguas maternas, o que o fez nosso diplomata para quaisquer circunstâncias; tendo, até na música, elevado nossa representatividade, assim como na poesia e na crônica;
Considerando, enfim, ter sido o DOUTOR JOSÉ RABELLO CAMPOS o filho de Virginópolis que, em vida, já se tornara o maior patrimônio desta terra, resolve decretar feriado o dia de hoje e luto oficial por três dias.


Dr. Amilar

Nota: Dr. Amilar da Cunha Menezes, advogado, professor, ex-vereador, homem de vasta cultura, Editor de "A Peneira" e particular amigo do Dr. Rabello, . 
Celina Rabello









Pesar - 20/05/1972 - “A Peneira” Nº 142


PESAR    (título dado pelo Editor)

Antônio Pinheiro Costa


Mariana, 3 de abril de 1972.

Prezada Dª Maria Aguiar,


Consternados, ainda, com a infausta notícia do falecimento do nosso particular e fraternal amigo Dr. Rabello, preocupamo-nos, agora, com a dor de todos vocês, a sua grande família, perda irreparável, que constitui o passamento deste ente tão querido e amado.
Mas acreditamos firmemente que a Divina Providência, em sua bondade infinita, dará a todos a força e a resignação necessária para ultrapassar este instante dorido, pois, afinal, tudo está previsto em seu plano da criação.
Além do mais, vocês constituem uma família privilegiada, por ter tido em seu seio, um homem tão extraordinário.
Uma cidade não significa nada, será uma simples porção de terra emoldurada por seus edifícios, se não for medida pela qualidade de seus filhos.
Virginópolis, que Dr. Rabello sempre amou, só pode ser devidamente mensurada após tomar-se a medida imensa do contorno moral e intelectual deste seu grande filho.
Adventício que era, tão logo que cheguei a nossa Virginópolis, procurava ansiosamente distinguir a silhueta da minha nova Comarca, com o sobrolho carregado de incertezas e preocupações, já que ela localizava-se em distante rincão mineiro e estava encravada no famigerado Vale do Rio Doce, do qual me falavam verdades e lendas pouco recomendáveis.
Que felicidade foi distinguir, na nossa primeira visão de Virginópolis, que vizinhando-se com a silhueta da torre de sua Matriz, estava a estatura moral e cultural deste grande virginopolitano.
Esta simbiose feliz, de um templo de Deus como medida da altura física e moral da nossa cidade, representa, também, uma síntese da vida do Dr. Rabello, pois foi, a um só tempo, um expoente de Deus e das coisas dos homens.
Sendo uma das mais belas filigramas criadas nas oficinas do imortal Caraça, este grande homem mantinha, na mesma altura da sua vastíssima e impressionante cultura, um profundo e autêntico sentimento religioso, suplantando em conhecimentos de nossa religião muitos de nossos virtuosos sacerdotes.
Impressionou-me, sobremaneira, como este homem se dava integralmente ao próximo, no mais profundo sentimento de caridade cristã.
Ele deu-se totalmente à sua família, pois, após curso brilhante na casa de Afonso Pena, que poderia guindá-lo aos píncaros pessoal se permanecesse num grande centro urbano, ao contrário, retornou a sua então pequena Virginópolis, para assistir a seu pai enfermo, e, em seguida, foi um incessante dar-se.
Deu-se à sua cidade, sendo o principal soldado de seu desenvolvimento, seu permanente professor, seu advogado indobrável e intimorato.
Deu-se aos humildes como ninguém até hoje, em Virginópolis, o superou.
Quantas e quantas vezes o vi debater-se na tribuna forense no patrocínio dos pobres, cujo mandato dativo nunca recusou.
Quantas e quantas vezes o vi assumir a tribuna do júri e vergastar os poderosos em favor dos fracos, bem como, com bravura indômica, agredir os descalabros dos politiqueiros e os desregramentos dos costumes.
Até nos fins de seus dias, este homem foi um grande.
Todos testemunharam a coragem com que ele sobrepôs ao sofrimento, e só um homem que tem a consciência de seu dever cumprido, aqui na terra, poderia confrontar-se com a morte com tanta altivez.
Este foi Dr. Rabello, e constituiu, para mim, uma das minhas maiores honras, ter privado de sua amizade.
Abraços,

Antônio Pinheiro Costa e família


Nota: Dr. Antônio Pinheiro Costa foi Juiz de Direito na Comarca de Virginópolis, de 1968 a início da década de 70. Era admirado por meu pai e tornaram-se amigos.
Em 1972, estava na comarca de Mariana, MG, de onde escreveu esta carta à minha mãe, 
Dª  Maria José de Aguiar Coelho. 

 Celina Rabello





Doutor Rabello - 20/05/1972 - “A Peneira” Nº 142


DOUTOR  RABELLO


Padre Absalão Martinho Coelho


Dr. Rabello, em Belo Horizonte.


Em carta endereçada ao Diretor da Peneira, Padre Absalão dedica algumas palavras ao nosso saudoso Dr. Rabello.

Como um homem de Deus – diz ele – eu o acho admirável. Sua consciência era muito delicada e isto o fez sofrer, mas superou a crise e cantou e contou as maravilhas de Deus em prosa e verso.

Depois que você e outros trouxeram a imprensa para Virginópolis, veio a público uma produção literária de valor. Suas composições sacras, em homenagem à Virgem, mostram toda a sua fé esclarecida e firme. Seus manuscritos trazem sempre as iniciais LDVqM.

Como um homem da comunidade, ele era o orador que agradava sempre, o político sempre atento, o despertador de vocações, que encorajava os bons
e corrigia os jovens. 

Homem da terra, nunca esqueceu o São Bento, onde nasceu. Você disse – e eu gostei muito de termo – que ele é sambentista. Eu diria que ele é beneditino também, pelas pesquisas que fez até o fim da vida, como testemunham seus manuscritos e o gabinete de estudos que ele não deixava.

Como caracense, o admiro muitíssimo. Quando eu era menino no Caraça, servi de intermediário entre os padres de lá e o Dr. Rabello, a quem recorreram, mais de uma vez, nas usas campanhas, para arranjar dinheiro. Certa vez numa dessas campanhas, ele ganhou, como prêmio de rifa, uma máquina velha e enferrujada de fazer fotografia ( melhor diria de estragar filme) e eu fui o ridículo portador da mercadoria. Isto prova que o Dr. Rabello nunca esqueceu o Caraça e não ficou só nos discursos e artigos que são bem conhecidos dos leitores da Peneira.

Por tudo isso a Virgem Maria lhe dará a recompensa merecida.
                            
OBS: Ouvi meu pai dizer, muitas vezes, que o Padre Absalão tinha uma inteligência superior e que era o maior conhecedor de música que ele já encontrara. Segundo ele, juntamente com Dª Efigênia Souza, “Marfisa”, os dois eram os maiores musicistas de Virginópolis; ela, grande organista que dedicou muito do seu talento para abrilhantar as celebrações religiosas da sua época.  
                                                                
Celina Rabello



  



Tio Zezé - 29/04/1972 - “A Peneira” Nº 140


TIO ZEZÉ


Maria Bernadete Campos Coelho Pinto
   
 

Não quero escrever sobre o Dr. Rabello. Sobre o poliglota, o tribuno, o poeta, o homem culto escondido sob vestes simples e pobres. Tão simples e pobres como as do mais humilde virginopolitano. “Não é a roupa que faz o homem”, disse ele muitas vezes.
Não. Desse Dr. Rabello não quero falar. Eu tinha demasiado orgulho dele. Minha fala seria suspeita. Eu quero falar do tio Zezé. Do tio Zezé que eu amei e choro a perda, quase tão sentidamente como chorarei meu pai. Do tio Zezé, da minha infância já bem longínqua. Das férias na fazenda do São Bento que ele tanto amou.
Do tio Zezé de quando lhe revirava a biblioteca à procura de romances e revistas. Aproveitando-lhe principalmente a ausência. Na época em que trabalhava em Guanhães. Ainda o ouço. Dete, Dete, não mexa nos meus livros. Aqui tem muita coisa que não pode ler. Quando quiser, peça,  que eu lhe emprestarei o que puder ler. Qual nada. Não conseguia vencer o fascínio que aquele quarto exercia sobre mim, e continuava a revirá-lo sempre que surgia oportunidade. Às vezes, acobertada pela "dindinha" Jovelina, que dizia “Não tem importância, é só colocar no mesmo lugar, que ele não vai notar”.
Quero falar do tio Zezé que passava horas e horas, noite adentro, contando fatos e estórias dos nossos antepassados. De gente que nunca vimos, mas que aprendemos a conhecer e amar através de suas palavras.
Era um amante de antiguidades. Prestava verdadeiro culto aos antepassados, perscrutando-lhes as vidas e os hábitos, numa curiosidade insaciável. “Eu sou de escorpião. Jamais saciarei a sede de saber” dizia sempre.
Ouvindo-o, pensava em Érico Veríssimo. Outro cultor do passado. Seus livros são epopéias de gerações. Há nos dois muita semelhança e uma única diferença. Única, mas irremovível. O autor de “O Tempo e o Vento” é um materialista. Situa-se no tempo. Enquanto que o nosso chorado intelectual, que grande consolação! Sempre pôs Deus à frente de tudo. Na vida e na morte. Jamais esqueceu os ensinamentos que recebeu desses antepassados, que tão bem soube cultuar.
Recebeu a doença tranquilamente, resignadamente, das mãos de Deus. Isto é, no fim. No início não o sabemos, pois ninguém lhe viu a alma.  Quem pode saber as lutas feridas no íntimo, de quem teve sempre hercúlea força de vontade. O certo, porém, é que no fim, em meio ao grande sofrimento de que foi vítima, era a efígie perfeita da conformação com a vontade de Deus. Nenhuma queixa. Nenhuma revolta. Sempre preocupado com os outros. Agradecendo o pequenino favor de um copo d’água, de umas cobertas ajeitadas.
E pensar que ele pressentia o fim. Sozinho, calado, guardava este presságio para si só. Na certa para não ferir os seus. Acompanhando o progresso da doença, certifiquei-me dia-a-dia disso. Do contrário, como explicar seus poemas? Por exemplo, o publicado no nº 71 de “A PENEIRA” de 12/04/69, há exatamente três anos.
“Agora, a festa se acabou.
Desçamos a montanha da vida.
Mas, antes da descida,
quero olhar, uma vez mais,
as voltas dos caminhos bonitos
que ficaram para trás.”

Ou o final do poema:

“Adeus!
Adeus, meu companheiro!
Agora, meu sonho,
meu irmão siamês,
vamos ver a realidade
do ser ou não ser”.
O poema todo rescende a morte, despedida, pesar, como o próprio tema: “Adeus”.  Por que isso, se não pressentisse nada?
- Pois é, meu tio. Você se foi. Nós também iremos um dia. E talvez mais cedo do que o supomos. Praza a Deus aceitemos a morte como o senhor soube aceitá-la.E ouso repetir, o que disse a um de seus filhos, à guisa de consolo: foi sábio e santo. Pois sabemos que para ser santo não é necessário fazer milagres.
  




Perfil do bacharel José Rabello Campos - 1935 - por José Figueiredo Silva

Perfil do bacharel José Rabello Campos 




Com aquela cara murcha e merencória,
De turíbulo em dia de finados,
Ninguém dirá, sem fatos comprovados,
Que o Zé Rabello é um bicho na oratória.

Mas, quando vierem os dias arejados,
Da justiça de Deus na voz da história,
É que veremos quão sublime glória
Vibra naqueles nervos descorados.

Porque provas tem dado com fartura,
nesta era do voto feminino,
guerra química, avião, radiofonia,

Querendo ser recordista de cultura,
Trocando o “cock-tail” de algum cassino,
Por um trabuco de Philosofia.

Escrito por seu colega de Faculdade - José Figueiredo Silva (Zé Patrício) - como um dos perfis dos Bacharéis em Direito de 1935, da Faculdade de Direito, da Universidade de Minas Gerais, precursora da UFMG. Soneto copiado e guardado com carinho, por seu filho e também advogado, José Lupciano Rabello Campos.




segunda-feira, 4 de novembro de 2013

Balada do Canário do Reino - 25/08/1968 - “A Peneira” Nº 40 - J.UM



BALADA DO CANÁRIO DO REINO

 J.UM

À Natália Campos                                                 




É um novelo de oiro pálido,

no puleiro da gaiola, de noite.

É o chicote enrolando

a corda da melodia para o açoite.



O galo cantou, primeiro, no terreiro:

São Pedro. Jesus.

Quando a frincha da janela,

deixar passar a luz, através,

será a minha vez.



Galo.

Você é o bedel da Faculdade do Dia.

Eu sou a quarta dimensão.

Senhora Dona da Casa,

abra a torneira:                                                            

eu vou duetar com a água.



Vou metralhar de semifusas

a emborcada bacia azul do firmamento.              

Vou furá-la de sons fosforescentes,

como peneira encantada.



Vou mandar, nas ondas magnéticas,

uma horda de mensagens polifônicas,

para as galáxias da barra da saia

do espaço redondo.



Vou atirar uma echarpe de seda

toda azul

nos braços do Cruzeiro do Sul.

Vou desenhar nele

o Kennedy crucificado,

bonito como o Cristo do Corcovado,

coroado

com o auriverde pendão da minha terra,

abrindo os braços

a quinhentos milhões de nebulosas.
Nebulosa Mz3

Vou povoar de discos voadores

gotejantes de notas sangrentas

as estradas azuis da cúpula do mundo.



Vou arremessar aos ares

foguetes espaciais

de fusas e semifusas.

Vou garatujar na Lua

o palhaço do Gagárin,

com um martelo na orelha

e a foice no pescoço,

para a adoração prostituída

do infinito – negativo dos parvos.


A Via Láctea

Vou acender, na Guanabara da Via-Láctea,

uma lagarta de fogo, em notas multicores.

Vou enfeitar de barbelas cintilantes

a lança do sagitário.  
                                  
Vou farpear uma bandarilha

de músicas dolentes de Espanha

no toutiço enrugado do Touro de abril.

Vou escrever as notas da escala

nos degraus dos Sete Céus,

amarrar um bambolê de notas inflamadas

na cauda do Leão,

encurralar, num círculo de árias chamejantes,

o Scorpio complexado.

Vou guizalhar-lhe a cauda

numa loucura de crótalos sonoros.

Vou colar um losango de semínimas,

entrançadas em Signo-Saimão,

entre os cornos do Capricórnio.



Vou mandar minhas notas, em surdina,

em fogos de lágrimas,

a melodia mais suave,

a música mais fina

ao Aquário longínquo. 
                     


Vou nele gotejar

notas em pétalas de rosa,

de rosa purpúrea e bela

entre os goivos da campa do Ideal.



Meu canto é um vaquejar de estrelas,

pelos sertões do céu

farpeados de cometas.



Vou acordar as sinfonias dormitantes

nas dobras da túnica do Universo.



Vou ritmar, em velocidades de loucura,

as tempestades lancinantes de Wagner

e os oráculos oníricos de Beethoven.

Vou tecer, de arabesco de colcheias,

uma mini-saia para a Virgem,

uma brassière de sustenidos,   
                      
rendilhada de arpejos e gemidos.

Vou cingir-lhe

ao mármore santo dos ombros

uma bandana de seda aurifulgente.

Ela vai dançar, num saracoteio de virgem  dopada,

como as Coribantes de outrora

na passarela do Zodíaco,

para estremecer

a plateia cor de opala

das galáxias pensativas.



Porque eu sou a quarta dimensão:

preexisto à plasmação dos Cosmos.

Sorri, quando Criador fez a luz,

cantei, quando Deus criou o som.



Vou soltar, pelos palcos estrelados,

num clangor de relinchos e de

trompas,

no ulular feminino das Bacantes,

a cavalgada louca das Valquírias.





Por entre o alarido

dos cometas desgrenhados

e o esborôo dos sistemas fumegantes,

ao tumulto dos conflitos estelares,

ao impacto dos sois moribundos,

ao chamejar das nebulosas na negridão

do espaço.



Vou acordar,

com o tumulto de fanfarras clamorosas,

o silêncio aterrante,

o silêncio eterno

desses espaços infinitos,    
                              

com este meu quérulo gorjeio,

- pipilante angústia do Efêmero,

- grito fracassado do Ideal.